No “Plano Integrado de
Enfrentamento ao Crack e outras drogas” está prevista a distribuição de armas
de choque, conhecidas como “taser”, para conter dependentes de crack.
Nada mais insano!
É do conhecimento público e
científico que as condições gerais de um dependente de crack é sempre muito
precária do ponto de vista de sua saúde. Tremendo engano é achar que a arma
“taser” seja algo inofensivo e que poderá ser útil para conter um
dependente de crack. Esse tipo de paciente, o dependente de crack, já apresenta
uma sobrecarga no organismo, é sempre alguém muito debilitado e o choque que a
“taser” provoca poderá facilmente acarretar um ataque cardíaco letal ao
dependente.
Enquanto países democráticos
e desenvolvidos criam “salas especiais” para atrair dependentes químicos e a
partir de então estabelecem laços de confiança que permita encaminha-los ao
tratamento mais adequado, o Brasil, lamentavelmente, prefere a contra mão das
Leis, instituindo a pena de morte para esses enfermos como se estivéssemos num
regime de exceção! Gasta-se errônea e desnecessariamente o dinheiro público.
Que barbárie!
Conter é diferente de
acolher. Conter nos remete à repressão, conter é reprimir, um ato executado de
qualquer maneira independente do resultado, das condições do paciente, pior,
nesse caso, porque é do domínio público a situação geral de precariedade do
dependente de crack. Nessas condições, portanto, os policiais que usarem
“taser” não poderão alegar desconhecimento de que poderia provocar o resultado
letal, portanto, responsável dolosamente pelo resultado advindo da contenção
equivocada!
Por outro lado, acolher nos
remete a compromisso. Sim! Compromisso com o próximo, com alguém que não se
encontra, no momento em que sofre a agressão, em pleno domínio de sua
integridade física mental e psicoemocional. Acolher quer dizer receber
incondicionalmente, para posteriormente destinar ao tratamento mais adequado.
Ninguém está interessado se
o Estado irá arcar, obviamente, com a indenização pela vida perdida, porque o
que estamos presenciando no Brasil é uma perversa inversão de valores. O Poder
Público que é responsável em preservar as vidas, equivocadamente, dá ordens e libera
armamento capaz de tirar vidas, e pior, dos menos favorecidos.
Um exemplo recente de um
caso fatal da utilização desse tipo de armamento foi o do estudante brasileiro
Roberto Laudísio Curti, perseguido por policiais na Austrália e morto após
receber disparos de armas de choque. Segundo os investigadores, Curti teria
ingerido uma pequena quantidade de LSD momentos antes do ocorrido (Globo.com).
Pelo que acompanhamos pelas mídias o jovem em questão tinha condição financeira
e vigor físico, mesmo assim não suportou o impacto do choque. Imagina o que
poderá ocorrer com nossos debilitados dependentes de drogas de baixa renda?
Temos informações de que no
Morro de Santo Amaro, na zona sul da cidade, ocupado por 150 homens da Força
Nacional desde maio desse ano, as armas já são usadas contra os viciados. A
ideia é que elas sejam usadas apenas em “casos de extrema necessidade”. Deixar
essa avaliação subjetiva ao policial, mormente, em uma fase em que a polícia
trabalha estressadíssima não é em nada coerente com a vida.
Os especialistas
paulistanos, grupo ao qual me incluo, criticaram severamente o uso da “taser”
contra os dependentes químicos por acreditar que o foco deve estar voltado para a saúde pública ou privada. E o diretor
do Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Unifesp, o renomado
Dartiu Xavier da Silveira, por exemplo, considera a prática “abominável”, já
que, segundo ele, não se pode esperar que alguém pare de usar drogas
sendo agredido. O argumento do respeitado Xavier faz todo o sentido
além de ser um oportuno apelo humanista.
Porém, o que se nota, é que
a política de guerra às drogas continua sendo a equivocada aposta do Brasil, um
país no qual parcelas da polícia já são truculentas e cometem excessos (surge a
possibilidade de ocorrerem fatalidades como na Austrália).
Um programa nacional de
combate às drogas é o mínimo que os cidadãos brasileiros esperavam do Governo,
não um programa qualquer, que pelo absurdo das propostas passa a lamentável
ideia de banalização da epidemia de drogas que continua a assolar o Brasil.
Essas medidas propostas pela
Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) demonstram pouco envolvimento
dos verdadeiros especialistas, ausência da imprescindível preocupação com os
menos favorecidos, falta de compromisso do Governo Federal na busca de soluções
adequadas para socorrer o país e evitar mais mortes de inocentes ao invés de
gastar o dinheiro público inadequadamente. Atitudes com essa não facilitará sua
resolução e, pior, poderá ainda gerar delicadas e perigosas consequências, em
especial às pessoas de baixa renda.
Conceição Cinti. Advogada e
educadora. Pós-graduada em Gestão de Pessoas. Especialista em Tratamento de
Dependentes de Substâncias Psicoativas, com experiência de mais três décadas.
Pesquisadora e colunista do Institutoavantebrsil.com.br e outros renomados
sites.
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