Recomendo esse
excelente artigo do Professor Luiz Flávio Gomes
De
1986 a
1990, como se vê, o movimento foi de ascensão contínua. Os homicídios só
aumentavam. Em 1990 veio a primeira lei dos crimes hediondos (Lei 8.072/90).
Seu efeito redutor positivo se deu em 1991 e 1992.
A Reforma penal vai decepcionar
O Senado está
dando andamento à reforma penal (foi aprovado em 17/12/13 o relatório final na
Comissão Especial de Senadores). Agora o texto vai para a CCJ e, depois, ao
Plenário. Aprovado o texto no Senado, será ele enviado para a Câmara dos
Deputados. Desde 1937 (Estado Novo), passando pelo Código Penal de 1940 e pelas
150 reformas penais até dezembro de 2013, no Brasil só temos conseguido
oferecer uma “solução” enganosa para o problema da criminalidade: edição de
novas leis penais, cada vez mais duras. Verdadeiro populismo punitivo, regido
pela criminologia populista/midiática.
Objetivamente (e
estatisticamente) as reformas penais costumam produzir efeito positivo efêmero
logo após a sua aprovação, quando produzem esse efeito (após o Código de
Trânsito Brasileiro, por exemplo), mas em seguida a criminalidade volta com
toda intensidade. Um exemplo dessa política desastrada (e absolutamente
ineficaz a médio ou longo prazo) são os homicídios:
De 1986 a 1990, como se vê, o
movimento foi de ascensão contínua. Os homicídios só aumentavam. Em 1990 veio a
primeira lei dos crimes hediondos (Lei 8.072/90). Seu efeito redutor positivo
se deu em 1991 e 1992. A
partir daí, a escalada sanguinária não mais cessou. De acordo com os dados
disponíveis no Datasus, do Ministério da Saúde, de 1986 até 1990 o crescimento
no número de homicídios passou de 56%. Entre 1990 e 1992, após a aprovação da
lei, a taxa caiu 8% e voltou a crescer 7,7% já no ano seguinte. A partir
de 1994, quando veio a segunda lei dos crimes hediondos, os homicídios não
caíram absolutamente nada. Ao contrário. Só aumentaram (de forma linearmente
ascendente). Entre 1994 e 2000 o crescimento foi de 39%. O selo de crime
hediondo colado em um crime não significa nenhuma garantia de diminuição do
crime.
O engodo da
política puramente repressiva do Estado brasileiro (uma das políticas públicas
mais irresponsáveis em toda a América Latina) está estatisticamente
evidenciado. Puro populismo penal demagógico, mesclado, às vezes, com
charlatanismo (que ocorre quando o populista atua com má-fé). No campo da
prevenção penal reside uma das grandes mentiras que são contadas para o povo
brasileiro que, desorientado e desolado, não se rebela coletivamente contra
elas. Mas fica sempre decepcionado.
Nenhuma reforma
penal do legislador brasileiro, de 1940 a 2013, fez reduzir a criminalidade, a
médio prazo. Nenhuma! Nenhum crime diminuiu sistematicamente. Passado o efeito
sedativo da nova lei, em seguida retorna a criminalidade. Para isso muito
contribui a falência da estrutura estatal punitiva, esgarçada, sucateada
(apenas 8% dos homicídios são apurados).
Enquanto
discutimos (no campo da dogmática penal) se o dolo está no tipo ou na
culpabilidade, se esta é psicológica ou normativa, se a pena tem sentido
retributivo ou preventivo etc. (o debate dogmático é relevante, sem sombra de
dúvida, mas insuficiente), o povo pobre está morrendo nas filas dos hospitais
ou sendo amassado como sardinha nos ônibus e trens lotados ou ficando mais
ignorante nas escolas públicas (porque não prestigiam o professor, não têm
estrutura etc.); nossa infraestrutura continua esgarçada, os desonestos
continuam “roubando” o dinheiro público, o brasileiro continua achando que
nossa terra vai dar certo só porque foi abençoada inicialmente por Deus e por
aí vai. A soma da esperteza do legislador com a ignorância de grande parcela da
população, mais a espetacularização da mídia, vem significando mais homicídios.
Algo em torno de
270 pessoas são massacradas diariamente no Brasil (130 no trânsito e 140 assassinadas).
Enquanto o legislador penal insiste na sua política penal rigorista e
populista, nos últimos 73 anos, 2 milhões e 300 mil pessoas perderam a vida no
trânsito ou por causa das mortes intencionais (dolosas)! São “mortes
antecipadas”, como diz Zaffaroni. Sem que tenha havido nunca qualquer tipo de
revolução! É a marcha da nossa insensatez. O dilema barbárie ou civilização
continua sendo um enigma no continente latino-americano!
Para cada reforma
penal (foram 150, em 73 anos), foram 17 mil cadáveres! Mortes nunca reduzidas.
Isso significa que deveríamos viver sem leis? Não. Impossível. As leis são
necessárias. O que estou dizendo é que as reformas penais populistas e
demagógicas não estão diminuindo os crimes! O povo brasileiro continua, no
entanto, pedindo mais leis, mais dureza, mais política de “mão-dura”. É a
guerra contra o crime. A criminalidade crescente é uma realidade. A guerra como
consequência única é questionável. Desorientação popular e midiática. Que
Sempre achará um legislador disposto a atender essa demanda. As reformas das
leis não custam nada (já dizia o utilitarista Bentham, 1782-1875).
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