LUIZ FLÁVIO GOMES (@professorLFG)*
“O crescente drama do sistema penitenciário” é o
título do editorial do jornal O Globo de 29.09.12, p. 20. Dele se extrai a
seguinte contradição: “que se trata de uma trágica realidade, superlotação,
condições deploráveis das prisões, submundo de agressões, ofensas morais e
físicas, violação da dignidade humana, quarta maior população carcerária do
mundo, mais de 500 mil presos, espremidos, crônico déficit de 200 mil vagas,
equação perversa, desumana taxa de ocupação de 1,65 preso por vaga, só perde
para a Bolívia (1,66), no presídio Aníbal Bruno a média de 3,6 detentos por
vaga, está inviabilizada a ressocialização, há distorções, crítica situação,
complexo prisional insuficiente, réus cumprindo penas em delegacias, excesso de
presos provisórios (40% do total), condições degradantes, de 2005 a 2011 o
volume de presos aumentou 74%, problema muito complexo, “mas com espaço para
soluções mais imediatas”. Qual? Construir mais presídios (o país tem um déficit
de 400 unidades).
Dizer que a “solução” para o problema prisional
brasileiro é construir mais presídios (400), diante de todos os vícios e
problemas citados, significa se dobrar servilmente ao discurso do populismo
penal midiático da pior qualidade, o que explora escandalosamente a emoção e a
ira da população (com a criminalidade e com a insegurança) para pedir mais
penas, mais presídios, mais mão dura etc. É a mesma coisa que dizer que a
“solução” para o analfabetismo é o fechamento das escolas, que a “solução” para
quem está se afogando é o esvaziamento da boia, que a “solução” para quem está
em chamas por todo o corpo é jogar mais combustível nele, que a “solução” para
o envenenado é tomar mais veneno.
Essa política repressiva
persistente e demagógica, que não apresenta nenhuma criatividade (tal como a do
ex-prefeito de Bogotá, que reduziu drasticamente a violência), deve ser
combatida com um tipo de tolerância zero. Trata-se de uma política que só
explora a emotividade da população e que chegou no seu limite. Não diminuiu a
taxa de nenhum crime no nosso país. Chega de embromação e de irracionalidade.
Em 1980 tínhamos 11,7 homicídios para cada 100 mil
habitantes, contra 27,3 em 2010. O Brasil é o 20º país mais violento do mundo.
O único país rico no top 66 (ou seja: o Brasil é o único país dos dez mais ricos
que faz parte dessa deplorável lista). Chega de demagogia midiática, populista,
que vende a ilusão de que a solução do envenenado é tomar mais veneno. Tome-se
o exemplo de Bogotá, que diminui sensivelmente a violência com inúmeras medidas
racionais (fechamento de bares, conscientização da população, controle das
armas, eficácia da polícia, justiça atuante etc.).
Enquanto não abrirmos os olhos contra o populismo
penal midiático, que explora dramaticamente a emoção popular, só vamos ver
embromação. Se o remédio que está sendo dado ao paciente não funciona, muda-se
o remédio. Ninguém persiste no remédio errado. O Brasil é o campeão mundial em
encarceramento no período de 1990 a 2010 (472% de aumento). Mesmo assim, nenhum
crime diminuiu. Logo, está evidente que a “solução” não é construir mais 400
presídios. A propaganda midiática da magia populista só engana as vítimas que
buscam mais vitimização. Prisão só para os criminosos perversos, perigosos. No
mais, penas alternativas. E uma ampla política de prevenção, totalmente
ignorada no nosso país.
*LFG – Jurista e professor. Fundador da Rede de
Ensino LFG. Diretor-presidente do Instituto Avante Brasil e coeditor do
atualidadesdodireito.com.br. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de
Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001). Siga-me: www.professorlfg.com.br.
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