terça-feira, 11 de junho de 2013

Brasil constrói presídios; Coréia do Sul expande educação

LUIZ FLÁVIO GOMES, jurista, diretor-presidente do Instituto Avante Brasil. Estou no luizflaviogomes.atualidadesdodireito.com.br 

O debate sobre a redução da maioridade penal, que tanto emociona o senso comum do rebanho bovino (esta última locução é de Nietzsche) e de seus pastores (legislativos, políticos, judiciais, religiosos, midiáticos etc.), nos leva, naturalmente, a comparar o Brasil com a Coréia do Sul. 

Em 2014 o Brasil sediará a Copa do Mundo de Futebol e vai mostrar para o mundo todo o quanto é precária nossa infraestrutura. Estádios, aeroportos, transportes, estradas, hotéis, comunicações etc., tudo pode nos envergonhar. No mesmo ano a Coréia do Sul vai abolir os livros de papel em todas as suas escolas: 100% dos alunos sul-coreanos usarão tablets eletrônicos. 

Um programa de 2 bilhões de dólares conectará todos os alunos da escola primária na internet. Em 2015 será a vez dos alunos da escola secundária. Na América Latina, neste item, destaque é o Uruguai, que tem um computador para cada aluno da escola primária. 

A Coréia do Sul fez sua aposta na educação. O Brasil, no crescimento das prisões, que vão agora explodir com os menores lá dentro. A Coréia do Sul está entre as campeãs em avanços educacionais. O Brasil é o campeão mundial (absoluto) no encarceramento de pessoas. Nos últimos vinte anos (1990-2010), houve aumento de mais de 470% (contra 77% dos Estados Unidos). A Coréia do Sul está educando, o Brasil está prendendo (e “educando” o interno para a criminalidade organizada). 

Enquanto a Coréia do Sul compra tablets para seus alunos, o Brasil está construindo presídios, ou melhor, campos de concentração e de treinamento (para melhorar a performance da crueldade dos presidiários). 

De acordo com levantamento do nosso Instituto Avante Brasil, a quantidade de detentos não-condenados nas cadeias brasileiras subiu 1.253%, de 1990 a 2010. Já o número de definitivos cresceu 278%. Quarenta e dois por cento (42%) dos detidos são provisórios. Em 1990 esse índice era de 18%.

Pesquisa da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) demonstra que a Coréia do Sul é uma das campeãs mundiais no uso de computadores pelos estudantes. No ensino médio, um para cada 7 estudantes. No Brasil, 1 para 33 alunos. 

De acordo com o exame mundial PISA (que avalia o nível dos estudantes), no item compreensão de leitura pelos alunos de 15 anos, a Coréia do Sul ocupa o segundo lugar. O Brasil é um dos últimos colocados. Está na frente do Zimbábue, é certo.

Em 2015 a Coréia do Sul já não estará gastando nada com papel, impressão e distribuição de materiais escolares: todo o conteúdo do curso estará disponível em tablets eletrônicos para os alunos. O Brasil, neste ano, em contrapartida, já terá alcançado a marca de (mais ou menos) 700 ou 800 mil presidiários. 

Quantas reformas penais o legislador brasileiro fez, de 1940 a 2012? 136 reformas no Código Penal. Diminui a criminalidade no Brasil? Nada. Em 1980 tínhamos 11 assassinatos para 100 mil habitantes. Em 2010, 27.4 mortos para 100 mil habitantes. Todos os indicadores criminais aumentaram. Em lugar da educação, jogamos nossa energia em reformas penais e encarceramento massivo. O resultado é o aumento do rebanho bovino e dos analfabetos. Por falta de informação, que raramente é dada pela mídia, chegou-se a 93% de apoio (Datafolha) para a redução da maioridade penal. 

Estudo realizado pelo Instituto Avante Brasil verificou (a partir dos dados do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) que no período compreendido entre 1994 e 2009 houve uma queda de 19,3% no número de escolas públicas do país; em 1994 haviam 200.549 escolas públicas contra 161.783 em 2009. 

No mesmo período o número de presídios aumentou 253%. Em 1994 eram 511 estabelecimentos; este número mais que triplicou em 2009, com um total de 1.806 estabelecimentos prisionais. Hoje está perto de 2 mil e 500 presídios.

Em 1950, 63% da força de trabalho brasileira estava na agricultura; 20% em serviços e 17% na Indústria. Na Coréia do Sul, no mesmo ano, 60% da força de trabalho estava na agricultura, hoje é menos de 10%; em serviços, de 28% subiu para 63% (hoje). A produtividade desse setor, na Coréia (conforme Ferreira e Fragelli, Valor Econômico de 22.05.13, p. A15), cresceu continuamente a 2% ao ano. A Coréia, mais pobre que o Brasil em 1950, é hoje duas vezes mais rica, em termos de renda per capita. Em 1960 o PIB per capita lá era de 900 dólares; hoje é de 32 mil dólares (Brasil, 10 mil). 

Em 1960 tínhamos (Brasil e Coréia) 35% de analfabetos. Hoje ainda temos 13% (sem considerar os analfabetos funcionais) e eles têm ZERO. Apenas 18% dos jovens brasileiros estão nas universidades; na Coréia, apenas 18% estão fora da universidade. A evasão escolar no final do ensino médio, no Brasil, é de 60%; na Coréia é de 3%. A Coréia do Sul, hoje, é uma locomotiva mundial. O Brasil é um grande presídio, cheio de analfabetos, sobretudo funcionais. 

A que se deve tanta diferença entre os dois países?...

Nos últimos 50 anos, enquanto a Coréia do Sul investia massivamente em educação, o Brasil, atendendo, sobretudo, a pressão midiática e o populismo punitivo, gastava seus parcos recursos construindo presídios. Qual dos dois países está preparando melhor seus jovens e adolescentes para a vida futura? O jovem sul-coreano está na Universidade, o brasileiro está na Universidade do Crime: quem tem mais chance de progresso? Qual país vai crescer mais? Quem estará melhor dentro de 10 anos?

A educação não saiu dos planos governamentais, muito menos da cabeça das elites pensantes e dominantes nos países asiáticos. Entre 1950 e 1980 a escolaridade média lá cresceu quatro anos; no Brasil, um pouco mais de um ano. 

Como se vê, a brutal diferença está na relevância que se dá à educação e à qualificação profissional. Eles estão treinando os jovens em escolas duras e profícuas. Nós estamos treinando grande parte da juventude no crime organizado e nos presídios. Os desníveis, claro, são marcantes.

Enquanto o Brasil vivia sua estagnação econômica entre os anos 80 e 90, quando então começou o processo de encarceramento massivo, a Coréia não descuidava da infraestrutura, da urbanização, dos serviços públicos, da escolarização etc. 

O debate que estamos agora fazendo sobre a criminalização dos menores, que deveriam estar todos na escola até os 18 anos, comprova que o senso comum do rebanho bovino não aprendeu nada com a Coréia do Sul. Continuamos repetindo nossos clássicos erros: fechando escolas e abrindo presídios! 

O Governo, a sociedade civil, os partidos políticos e o mundo empresarial deveriam promover um sério e definitivo pacto pela educação de qualidade para todos, que começaria a produzir frutos notáveis imediatamente (não daqui a 20 anos, como afirmam os pessimistas), na medida em que todos os menores estariam fora das ruas, nas escolas, das 8 às 18h, em tempo integral, desde tenra idade até os 18 anos (com algumas exceções controladas pelo Ministério Público, a partir dos 16 anos). 

O Brasil, perdido em discussões sobre como aumentar o número de presidiários, fechando escolas para construir mais presídios, sem sombra de dúvida, é um país que se apresenta mundialmente de ponta-cabeça: DESORDEM (geral: na economia, no controle social, no processo de urbanização etc.), PROGRESSO (sétima economia do mundo) e BARBÁRIE (isso é o que deveria estar escrito na nossa bandeira). 

Estamos longe de chegar ao ser humano do grande meio-dia, como diz Nietzsche. Estamos muito mais para o primata das 8h da manhã, que para o Super-humano do entardecer. Que pena! Quanta oportunidade perdida! Quantas gerações futuras perdidas! Quantas vidas perdidas! Quanto analfabetismo! Quanto senso comum de rebanho!




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